Ari do Rego dos Santos
Licenciado em Geografia, professor da rede
estadual de ensino do Piauí, funcionário público municipal e aluno do curso de
Licenciatura em Química.
Nos anos de 1346 e 1353 aconteceu o auge da pandemia da Peste negra, também
conhecida como Morte negra que segundo a história, vitimou um terço da
população existente na época. Entre os anos de 1918 e 1920, outra pandemia, a
gripe espanhola matou milhões no mundo, aquela que ficou conhecida como a maior
pandemia da história. No Brasil foram milhares de óbitos por causa dessa gripe.
Já no século XXI, mais precisamente no ano de 2009 surge no México um vírus
influenza, a gripe suína que vitimou centenas de milhares de pessoas pelo
mundo. Essas são algumas das grandes pandemias que ocorreram antes da atual
pandemia do coronavírus (COVID-19).
E o que essas pandemias têm em comum com
a COVID-19? Além dos doentes e das mortes, apesar de em números diferentes, os
transtornos sociais, sanitários, políticos e econômicos. E este último tem
causado no governo brasileiro e em uma parte significativa da população, um
pânico grande ou até maior do que o pânico causado pelo o avanço da circulação
do vírus, em grande parte provocado pela pressão de setores da economia com
ameaças de fechamentos de empresas, o que ocasionaria desemprego em massa. É o mercado
buscando obrigar o Estado a intervir na economia, já que estamos ou nos
aproximamos de uma crise econômica mundial. É o mercado neoliberal agindo. Isso
no Brasil e no mundo.
Porque,
desde o surgimento da doutrina conhecida como liberalismo econômico, em
momentos de crise é sempre o Estado que têm que intervir na economia para que
esta se recupere e todo o sistema econômico não entre em colapso. E ele tem feito isso ao longo da história.
Ao longo do século XVIII, o
absolutismo e o mercantilismo, sistemas políticos e econômicos respectivamente,
começaram a entrar em crise por causa do avanço dos ideais disseminados por
alguns intelectuais que ficaram conhecidos como iluministas. Ideais estes,
centrados na autonomia da economia em relação à sua própria sobrevivência e
regulação. E dentre os teóricos desse novo pensamento, destacou-se as ideias de
Adam Smith
autor do livro “A Riqueza das Nações”
considerado um marco na fundamentação teórica do liberalismo econômico,
doutrina que defendia o livre mercado, a especialização do trabalho, a lei da
oferta e da procura, maior liberdade para a iniciativa privada e a não
intervenção intensa na economia por parte do Estado, sendo que o mesmo deveria
funcionar mais como um assistente da mesma com o provimento das infraestruturas
para o seu funcionamento e seu interventor proeminente em épocas de eventuais
crises.
Na
década de 1920, com o fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), os Estados Unidos se consolidava como
a maior economia do mundo. Com o crescimento próspero no pós-guerra, a economia
americana criou nos americanos uma enorme euforia econômica, fazendo com que
houvesse uma superprodução, especulação financeira e a consolidação de um
estilo consumista que não foi acompanhado do aumento salarial da classe
trabalhadora. E isso depois começou a trazer problemas, já que o país naquele
momento era responsável por quase metade do que era produzido no mundo. Então,
os baixos salários não permitiram a absorção da grande quantidade de
mercadorias que eram produzidas e o resto mundo, também não tinha condições de
fazer isso, pois estava ainda em recuperação dos efeitos da guerra. O que
abalou o otimismo de grande parte dos que tinham ações das empresas americanas,
levando a uma onda de venda dessas ações o que resultou na chamada Crise de
1929 (Quebra da bolsa de Nova York), também conhecida como Grande Depressão que
foi responsável por uma grande recessão econômica
que atingiu o capitalismo internacional e inaugurou
a decadência do liberalismo econômico naquela ocasião.
Mas mesmo em decadência
momentânea, um de seus princípios foi posto em prática com a intervenção do
Estado na economia por meio do New Deal
que foi um plano econômico focado no controle da emissão de valores monetários,
investimentos em setores estratégicos da indústria americana e em medidas para
a geração de empregos, buscando assim, a recuperação econômica do país e do
mundo, nos anos de 1933 e 1937, no governo do então
presidente Franklin Delano Roosevelt.
Mas
essa intervenção não foi suficiente para resolver totalmente toda a instabilidade
econômica daquele período e a própria economia americana continuou em crise por
mais alguns anos e a de muitos países recém-arrasados pela guerra, também
continuaram em declínio e muitas até faliram. E
isso, somado à ascensão do totalitarismo em alguns países e o sentimento de
revanche da Alemanha naquela altura, já nazista, por ter sido derrotada na
Primeira Guerra, resultou na Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e outra vez a
Europa estava em caos econômico.
E
novamente o Estado foi apelado a intervir na economia. O que ocorreu por via do Plano Marshall que foi um grande programa de ajuda econômica
dos Estados Unidos para os países da Europa Ocidental, devastados pela Segunda
Guerra Mundial e objetivava a reconstrução predial, da indústria e da
economia dos mesmos.
Ainda
dentro desse contexto de recuperação econômica mundial e da falência do modelo
econômico liberal, teve início na década de 70, a crise do petróleo que foi
originada pelo o
alvoroço causado pela descoberta de que ele era uma fonte de energia finita.
Pois, o petróleo naquele momento já era o combustível motriz do novo modelo
industrial e artigo de orientação da geopolítica mundial.
E em resposta a essa crise e a
toda essa situação de caos econômico que perdurava, principalmente nos países
envolvidos e nos afetados pela as duas guerras mundiais, foi implantado por
governos de vários países, no final da década de 70 e início dos anos 80, medidas
liberais para a recuperação de suas economias, como fez Margaret Thatcher que
foi Primeira-Ministra do Reino Unido nos anos de 1979 a 1990 e conduziu um audacioso
programa de privatizações no território britânico inaugurando assim, o
Neoliberalismo, doutrina que além de ter os mesmos princípios do Liberalismo,
já citados anteriormente, também preconizava o desaparelhamento do Estado e um
distanciamento maior deste, na economia, haja vista, que com a crise de 1929 o
Estado voltou a ter novamente mais controle da mesma.
Margaret Thatcher foi considerada
a mãe desse Neoliberalismo que apesar da ideia de novo, apresentou princípios
comuns aos do Liberalismo, podendo ser considerado uma reformulação do mesmo.
Ainda que trouxesse algumas novas características como: medidas contra o protecionismo
econômico, abertura para a entrada de empresas multinacionais, a livre
circulação do capital estrangeiro. Ou seja, sendo uma consolidação da
globalização.
E já no curso desta “nova” doutrina surge a crise
de 2008, considerada a maior crise do capitalismo internacional desde a crise
de 1929. Onde o crédito fácil levou à falência alguns bancos de investimentos
dos Estados Unidos e levou pânico às bolsas de valores no mundo inteiro e gerou
efeitos econômicos negativos que perdurou por alguns anos seguintes. E
adivinha. Novamente o Estado interviu para conter a crise. Os Estados Unidos lançou
um pacote bilionário de ajuda econômica naquele ano.
Então o que acontecerá agora,
nesta crise econômica que se aproxima, causada pelo coronavírus?
Inevitavelmente o Estado terá que
intervir na economia para que o mundo não quebre. Aliás, isso já vendo sendo
anunciado e feito por alguns países. Os Estados Unidos lançou dias atrás o
maior pacote de estímulo econômico da história.
O Estado brasileiro, apesar de
tímido, vem intervindo na economia, atendendo ao mercado brasileiro que além de
pressionar por essa intervenção, tem tentado obrigar os trabalhadores a
voltarem à produção no país.
Temos acompanhado nos últimos dias,
várias manifestações de grandes e conhecidos empresários brasileiros, tentando
relativizar os efeitos da COVID-19 e procurando criar pânico em relação à catástrofe,
segundo eles, da economia nacional.
Alguns chegando até levantar a hipótese
de desempregar milhares de pessoas.
Tudo pressão. É apenas uma forma
de pressionar o Estado a crescer em termo de líder operacionalizador das
soluções econômicas para o momento. Sempre foi assim, em épocas de bonanças econômicas,
menos Estado e em época de crise, mais Estado.
Hora, pensem comigo. Se
estivessem mesmo preocupados com o desemprego da população, teriam feito alguma
coisa pelo os quase 12 milhões de desempregados que tinha no país antes da
entrada desse vírus.
E não fizeram por quê? Porque
como tinha milhares de pessoas trabalhando, crescendo o capital de seus “donos”,
os desempregados representavam a sobra do sistema e, portanto sem importância.
Mas agora é diferente. Uma parte significativa dos trabalhadores está parada e os donos do capital se veem na eminência da redução de suas fortunas e é isso que os incomoda. E pressionam porque sabe que o desemprego, além de causar instabilidade econômica, causa também, instabilidade política, o medo número 1 do governo.
Mas agora é diferente. Uma parte significativa dos trabalhadores está parada e os donos do capital se veem na eminência da redução de suas fortunas e é isso que os incomoda. E pressionam porque sabe que o desemprego, além de causar instabilidade econômica, causa também, instabilidade política, o medo número 1 do governo.
Sabemos
também que o desemprego em massa não é ruim somente para a classe trabalhadora,
para os mais pobres, mas também para os empresários e para toda a economia. Já
que sem dinheiro circulando, diminuirá a produção que diminuirá o capital dos
operacionalizadores do sistema. Enfim todo mundo quebra.
Por isso o que vai acontecer é
que o Estado vai ter que injetar dinheiro na economia e cumprir com o seu papel na
economia neoliberal.
E
diante disso, nos resta fazer uma pergunta: Não seria hora do surgimento de um
novo neoliberalismo mais humano e menos apegado ao lucro e que acima de tudo,
em tempos de crise, sejam as saídas conduzidas pelo o próprio mercado? Mercado
esse que quando a economia vai bem, é quem colhe os melhores e suculentos
frutos dessa grande engrenagem formada pelo capital e milhares de trabalhadores
que vendem e a um preço baixo, sua força de trabalho.
Fica a expectativa de que quem
sabe, algum grande líder mundial a exemplo de Margaret Thatcher, e
juntamente com os donos do capital atual, possa pensar e implantar uma nova
doutrina econômica menos “predadora” da massa trabalhadora e das economias
nacionais. Onde o mercado possa, em tempos de crise, como agora, prestar
serviços, produzir e comercializar apenas pelo o custo dos insumos e da
produção, ajudando a população de modo geral e à economia dos países,
garantindo os postos de trabalho e deixando por alguns meses, de lado, o lucro.
E só para constar, não sou anticapitalista.
Apenas gosto de questionar algumas das desvirtuosidades praticadas por alguns
capitalistas oportunistas e aproveitadores.
E voltando à
pergunta geradora dessa discussão: O que o Neoliberalismo tem em comum com a
COVID-19? A COVID-19 está causando uma
crise econômica mundial e o Neoliberalismo por meio do Estado, está sendo convocado
para resolver os efeitos da crise ou pelo menos para amenizá-los.